
por Linck
Antes de tudo gostaria de agradecer o convite do Ciro para escrever aqui. Demorei para achar o tom na medida em que já escrevo em outro lugar e não queria apenas fazer mais um texto de “rotina”. Pensei então em concentrar uma discussão que de certa maneira se dissemina em cada texto lá no Quadrinhos na Sarjeta: A verdade das HQs! (música de revelação). Isso é pretensioso? Demais. E é mentiroso também. Eu não falo da verdade, muito menos das HQs, mas quero pensar um pouco o problema da verdade.
É sabido que historicamente os quadrinhos foram pouco lidos pela academia. Há diversas iniciativas que se destacam, mas pontuais. No Brasil existem duas tradições bastante fortes, a tradição semiótica e a tradição marxista. Mesmo assim num país pouco escolarizado e bastante alheio ao mundo acadêmico, essas duas linhas não encontraram muita ressonância no leitor comum. Com isso criou-se um curioso cenário de isolamento. Não só isolamento da academia com o leitor, mas também entre os pequenos grupos que estudavam quadrinhos no âmbito acadêmico.

O gradual movimento de valorização das HQs na Europa nos anos 1960, no Brasil nos anos 1970 e nos EUA nos anos 1980 fez os quadrinhos integrarem toda uma sorte de debates nos dias de hoje, sejam eles estéticos, políticos, mercadológicos, etc. Somados à internet, com a profusão de blogs e sites a respeito, qual o resultado mais provável? Um estranhamento. Mas não qualquer estranhamento, falo do tipo ciumento mesmo, ensimesmado que quando vislumbra um olhar muito diferente sobre algo já consolidado para si, tende a deixar de ver, rejeitar ou até mesmo agredir. “Como ousa dizer que o Batman é assim quando ele é assado?” é a personificação desse gesto. Academicamente outro clichê é “você não pode ler Batman assim ignorando a teoria a, o autor b e tradição c”!
O que está em jogo no cenário atual é uma espécie de choque com o reflexo. “Como alguém que curte Conan, como eu, pode ser tão diferente?” A resposta, creio eu, é porque as HQs são de fato uma arte rica, como qualquer coisa que pode ser enriquecida quando tanta gente devota uma paixão. O maior desafio agora, entre os leitores, nos blogs e na academia, é a abolição da verdade. Do conceito de verdade, dessa metáfora que a gente usa pra encerrar uma discussão e preservar narcisicamente um pensamento. “Isso é verdade, tudo o que você disser contrário é mentira!”. A afirmação de uma verdade é a maior covardia perante a responsabilidade que um olhar pode ter. Só hipocritamente se eximindo de nossa atuação extrínseca que dá pra qualificar como verdadeiro algo intrinsicamente.
